quarta-feira, 2 de agosto de 2017

Digestão, ato e construção agressiva

Qual a melhor estratégia para entender e intervir no comportamento depressivo, a antiga melancolia descrita pelos gregos ou a atual patologia classificada no CID 10 revisão, como episódios e transtornos depressivos?

Parafraseando Lacan são inegáveis as contribuições da psicanálise sobre a experiência subjetiva com seus resultados na psicologia concreta. Na psicologia das emoções, por exemplo, podem ser identificados estados tão diversos como o medo fantasístico, a cólera, a tristeza ativa e a fadiga psicastênica (Lacan, 1998 p.112-113)

Intrigantes também são as contribuições da psicanálise à criminologia, o estudo dos motivos do suicídio e a pertinente a observação que fez sobre o poder do ato agressivo desfazer a construção delirante. (Lacan, 1998 o.c.)

Vincente Van Gogh

No caso específico do suicídio e tristeza são também relevantes as observações de Storr (1978) sobre a depressão e agressividade. Ao meu ver considerando o conjunto de sinais e sintomas da síndrome depressiva temos como estratégia a intervenção em qualquer um de suas manifestações. A ênfase tem sido dada a abordagem farmacológica de neurotransmissores da tristeza/alegria (?), mas há sinais e sintomas relacionados à fadiga, desânimo  e/ou, há os aspectos subjetivos e circunstanciais interpessoais da origem de tal sentimento ou de sentimentos como o luto, o remorso, ou sensação de culpa e baixa de auto-estima.

Recentes pesquisas sobre saúde do microbioma intestinal e saúde mental especialmente depressão me fizeram voltar a questão das observações de Storr sobre depressão e agressão especialmente da condição de entrada e saída no quadro depressivo com episódios e manifestação de irritabilidade e agressão, o que não é nenhuma novidade para medicina tradicional chinesa que associa a irritabilidade e raiva a disfunções do meridiano do fígado. O Dr. Fernando Hoisel, psiquiatra e médico nutrólogo, comentando tal relação (em comunicação pessoal) me fez observar a etimologia da palavra “enfezado” como possível constatação e também suas observações clinicas da melhora dos estado geral de saúde com o tratamento da prisão de ventre. Algumas vezes citou um dito da medicina natural ou sabedoria popular que recomendava mamão para abrandar irritação e a raiva.

A proposição de Anthony Storr, expressa no capítulo ( 8) "agressão em relação à depressão" do seu livro "A agressão Humana" (1976) é o registro de que: apesar da relevância a tristeza na depressão, esta não é o principal sinal de tal condição. Assinala que "também existe uma indisposição para a atividade que pode chegar a imobilidade quase completa e um retardamento dos processo mentais...uma perturbação do ritmo do sono, perda do apetite, constipação, diminuição do desejo sexual entre outros sinais onde destaca a severa inibição do impulso agressivo precedido ou sucedido pela irritabilidade, antes ou depois do quadro depressivo propriamente dito (o.c. p.90, 92)

Ainda segundo Storr observe-se que relação entre a agressão e a depressão também pode ser sublinhada pela referência ao estudo recente de D. J. West, Murder Followed by Suicide, onde se constatou que “de cada três assassinatos cometidos na Inglaterra, um é seguido pelo suicídio do assassino. O que por sua vez nos remete à proposição ou hipótese de Freud de que, segundo ele, a agressão contra outros e a agressão contra o eu estão reciprocamente relacionadas e são, até certo ponto, intercambiáveis.

Para finalizar este breve escrito de pesquisa sobre as estratégias de intervenção na síndrome depressiva para que não seja somente o ato agressivo o que desfaça a construção agressiva deixo esta preciosa reflexão sobre o conceito de “passagem ao ato” na psicanálise e a recomendação de leiam sobre tal artigo ou questionem a proposição de intervenções na regulação do aparelho digestivo associada ou não à intervenções psicofarmacológicas e psicanalíticas.

"O papel do sintoma, estimava Freud, é o de proporcionar uma resposta à angústia. No entanto, existem casos em que, de forma temporária ou duradoura, a angústia não fica velada pelo sintoma e o sujeito se vê diretamente defrontado com ela. Em tais casos podemos descrever dois tipos de configuração sintomatológica: um em que a angústia é o sintoma dominante sem necessariamente encontrarmos saídas pelos atos, e outro no qual a angústia irá determinar ações, ainda que se trate de demandas veladas de ajuda (acting-out), ainda que seja que o sujeito periga com elas uma saída definitiva (passagem ao ato)". Álvarez, Esteban e Sauvagnat (2004, p. 268, apud: Calazans, Bastos, 2010)

Referências

BARNEY, Joshua  Probiotic in Yogurt Reverses Depression. March 07 2017

CALAZANS, Roberto; BASTOS, Angélica. Passagem ao ato e acting-out: duas respostas subjetivas. Fractal, Rev. Psicol., Rio de Janeiro , v. 22, n. 2, p. 245-256, Aug. 2010 . Available from < http://www.scielo.br/pdf/fractal/v22n2/02.pdf >. access on 02 Aug. 2017.

LACAN Jacques. A agressividade em psicanálise. in: LACAN Jacques. Escritos. RJ Zahar, 1998 Disponível na Página da BIBLIOTECA SIGMUND FREUD

MARIN, Ioana A. et al. Microbiota alteration is associated with the development of stress-induced despair behavior. Nature Scientific Reports 7, Article number: 43859 (2017) https://www.nature.com/articles/srep43859  aces. agosto, 2017

STORR, Anthony. A agressão Humana" RJ: Zahar, 1976

TORRADO.  Depressão - Um Estudo de como a Medicina Ocidental e a Medicina Tradicional Chinesa se Complementam. Curitiba, Paraná: Ed Juruá, 2009 
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Ilustração: Tristeza é uma litografia do pintor holandês Vincent van Gogh, datada de 11 de novembro de 1882. A mulher grávida que serve de modelo à obra, Clasina Maria Hoornik (mais conhecida como Sien), foi uma prostituta com quem Van Gogh viveu entre os anos de 1882 e 1883. (Wikipédia)


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Ver também:  Dian Kuang - 癫狂

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