segunda-feira, 17 de março de 2014

Treinamento autógeno e auto-controle

O autocontrole numa perspectiva behaviorista da bio-realimentação corresponde à específicas respostas controladoras aprendidas progressivamente, tais como sinais / sensações corporais no caso de controle do tônus – muscular, além da seleção dos estímulos ambientais adequados, no caso as contingências associados ao aumento de tensão muscular. Segundo Burrhus Frederic Skinner (1904 - 1990) nenhum místico ou asceta deixou de controlar o mundo em seu redor, controla-o para controlar a si mesmo ainda que seja escolhendo um estilo de vida próprio pois, segundo Skinner, não podemos escolher um gênero de vida no qual não haja controle, podemos tão só mudar as condições controladoras. (Skinner, 2006)

O desafio permanece sendo o domínio das emoções e do corpo, atividades autonômicas ou seja atividades que hoje sabemos reguladas pelo sistema nervoso autônomo, especialmente nas complicações classificadas como distúrbios psicossomáticos. O primeiro passo é compreender o processo de bio-realimentação as respostas emitidas para as informações que recebemos sobre o funcionamento de nossos órgãos internos, tais como coração, glândulas, músculos e cérebro, como por exemplo, sudorese, frequência cardíaca, etc. (Stern; Ray, 1978)

Observe-se contudo, como pondera o próprio Skinner (2003) ao dar ênfase ao poder controlador das variáveis externas, deixamos o organismo em uma posição peculiarmente desamparada limitado ao que parece ser apenas um "repertório" (um inventário de comportamentos ou etograma diriam os etólogos) de ações mais ou menos prováveis, à medida que o ambiente se altera. Por outro lado reconhece-se a “liberdade”, livre arbítrio ou certo grau de "autodeterminação" da conduta, ao menos como cita Skinner no comportamento criador do artista, do cientista, no comportamento auto-exploratório do escritor, na autodisciplina do asceta ou, com freqüência, quando a resposta de um indivíduo tem conseqüências que provocam conflitos, ou seja, quando tem como contingência tanto a reforço positivo quanto a negativo (uso do tabaco por exemplo),

Sabemos também que as reações e comportamentos se estruturam em hábitos (atos automatizados por causa do reforço) e que, por outro lado, um comportamento apresentado em qualquer momento, está sob controle de um cenário atual. Nessa perspectiva podemos compreender o comportamento voluntário como um conflito entre tendências de ação associadas à distintos conjuntos de estímulos.

Segundo Skinner, 2003, o indivíduo vem a controlar parte de seu próprio comportamento quando emite uma resposta controladora que pode manipular qualquer das variáveis das quais a resposta controlada é função; uma resposta, a controladora, afeta variáveis de maneira a mudar a probabilidade da outra, a controlada. Sabemos pois que o organismo pode tomar a resposta punida menos provável alterando as variáveis das quais é função. Qualquer comportamento que consiga fazer isso será automaticamente reforçado. Denominamos autocontrole estes comportamentos.

O psiquiatra berlinense Johannes Heinrich Schultz (1884-1970) em seu método treinamento autógeno propõe tomar a vivência de peso como ponto de partida, senão outra condição psicofisiológica para controle inicialmente do tônus muscular e progressivamente da demais funções fisiológicas circulação, batimentos cardíacos, respiração, sistema metabólico endócrino, funções iônicas e viscerais (efeito analgésico), reações vegetativas e estados da consciência (na maioria das técnicas iogues associadas ao jejum e controle da respiração).

Segundo esse autor se num esquema simples imaginarmos o corpo, com seus sistemas funcionais, animado de uma consciência do eu, podemos perguntar quais de ditos sistemas estão mais estreitamente unidos com este eu esquemático. A ordenação torna-se muito clara, segundo ele, Junto ao centro fictício do eu está a musculatura esquelética, cuja função habitual nos transmite a impressão errônea do movimento voluntário. Segue-o o sistema circulatório, que todavia está em relação direta com as vivências do eu. Menos direta é já a relação do eu com os fenômenos vegetativos gerais, tal como nos mostra a observação diária, a clínica e a experiência. A relação mais afastada se estabelece com o sistema de sustentação esquelética. Este escalonamento podemos representar graficamente mediante uma série de círculos concêntricos em volta do centro fictício do eu. (Shultz, 1967 p. 69)


Possibilidades de domínio do "Eu-Corpo" (imagem modificada Shultz, 1967)

J. H. Shultz considera esse esquema (apresentado na figura) como provisório substituindo-o também em representações gráficas por uma sucessão de círculos que parte do Eu (sempre de dentro para fora) para sistema nervoso central (leia-se atualmente na neurofisiologia moderna córtex ou lobo frontal, centros da linguagem e sistema reticular ativador) e em seguida para um nível de autocontrole do sistema neurovegetativo e daí para componentes químicos e iônicos coloidais cujo efeito mais visível e imediatamente verificável é a analgesia induzida por auto-hipnose e/ou a redução da atividade metabólica.

Naturalmente que são muitas as formas de se conseguir a auto-determinação, seja do estilo de vida, controle do mundo externo ou relação consigo mesmo. As intervenções da biomedicina consideram por exemplo a possibilidade de intervenção em cada aparelho, sistema ou função orgânica, privilegiando intervenções químico/farmacológicas ou anatômicas (cirurgia bariátrica por exemplo). As possibilidades ampliação dos sinais internos pelas técnicas eletrônicas do biofeedback (biorealimentação) condicionamento pavloviano dos órgão internos (bastante divulgado pela técnica do parto sem dor), apesar da plausibilidade e sucesso, ainda permanecem incipientes em nosso meio.

Entre as medicinas complementares destacam-se a medicina ayurvédica especialmente o Yoga, e a acupuntura (shiatsu, do-in) com resultados práticos evidenciáveis, apesar dos aspectos não compreendidos face a barreira dos idiomas e culturas no âmbito das explicações teóricas . Uma integração entre essas diversas técnicas é o que se vê na prática e formação dos diversos profissionais de psicoterapia que atuam, ensinando, tratando, respondendo ao desafio do autocontrole.

Referências

Schultz, J.H. O treinamento autógeno, (1932). SP, Mestre Jou, 1967

Skinner, Burrhus Frederic. Sobre o behaviorismo. SP, Cultrix, 2006.

Skinner, Burrhus Frederic. Ciência e comportamento humano. SP, Martins Fontes, 2003.

Stern, Robert, M; Ray, William, J. Bio-realimentação e o controle das atividades físicas internas. SP, Brasiliense, 1978